quarta-feira, 16 de outubro de 2013

A privatização da REN

Não me querendo pronunciar especificamente sobre o caso José Eduardo dos Santos, que vejo como uma manobra negocial para que Portugal se subjugue aos interesses angolanos e porque, na verdade, não representa grande retrocesso nas relações entre os dois países. Na verdade, as empresas portuguesas têm estado a apostar em Angola e investidores angolanos têm estado a investir em Portugal, sem ter existido parceria política "estratégica", o que me leva a crer que na verdade nada se altera. Adia-se ou impede-se um aprofundamento da relação, o que era desejável, mas mais uma vez, o que José Eduardo dos Santos quer é ganhar no tabuleiro das negociações e, sobretudo, das concessões do Estado Português.

Preocupa-me mais um raciocínio que me ocorreu juntando dois títulos que circulavam ontem: o fim de uma parceria estratégica entre dois Estados que mantém relações diplomáticas e a privatização total da REN*. Não me importa especificamente o caso Angola, vejo o caso do ponto de vista abstrato, enquanto relação diplomática entre dois estados. Podia ser os Estados Unidos, a Rússia, a China ou a Costa Rica ou qualquer outro País.
 
Não sou avesso às privatizações. Considero até que as privatizações são em geral muito positivas quando traduzam a oportunidade de criação ou integração de um player dentro de um mercado concorrencial. Por outro lado, a saída do Estado de determinados setores de fornecimento de bens e serviços é de aplaudir.

Mas vejamos o caso da REN. Está em causa a Rede Elétrica Nacional ou seja é o operador que garante o transporte da energia. Não estamos a falar do fornecimento da eletricidade ao comum dos cidadãos, mas da própria rede. O fornecimento é-nos garantido pela EDP, Iberdrola ou pela Endesa, por exemplo.

Ora, após a privatização não é possível garantir quem serão os acionistas da empresa amanhã. E isso é bom!
O problema surge quando se aliena um setor que é estratégico e, acima de tudo, que é o garante do fornecimento de energia elétrica (e de gás) em todo o País. Assim, visto em perspetiva, podemos desenhar um cenário eventual. Uma empresa detida a 100% por um determinado Estado estrangeiro, adquire uma participação relevante na REN.  
 
Naturalmente que quando isso acontecer, Portugal estará na mão dessa empresa, ou melhor desse Estado. Se houver uma crise diplomática grave, Portugal fica totalmente subjugado aos interesses dessa outra nação. Até podemos ter trinta players que nos fornecem energia em casa, mas se a REN não permitir a passagem da eletricidade, podemos esbracejar, pedir desculpa ou lamentar os erros do passado, mas não vamos conseguir ver as notícias na televisão, carregar um telemóvel ou aquecer uma refeição ou um biberon no micro-ondas.
Portugal não é um País que se dê a grandes conflitos, mas a história revela-nos que nem só de paz é feito o nosso passado. Antes de privatizar o que falta da REN (9,9% + 1,2%), vale a pena pensar como é que vamos garantir a nossa independência política e económica e isso não passa só pela redução da dívida pública.
 
* A REN é atualmente detida em 9,9% pela Parpública, 1,2% pela Caixa Geral de Depósitos, 25% pela State Grid (detida pelo Estado Chinês) e 15% pela Oman Oil (Índia).

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