O último post do
Rui levantou uma questão muito interessante e que me suscita os seguintes
pensamentos:
O problema da natalidade em Portugal tem raízes muito
profundas e até dificilmente explicáveis. Na verdade, podemos até dizer que
existem tantas razões quantas as pessoas que decidem ter filhos.
O primeiro aspeto que creio motiva o número tão baixo de nados
vivos é a motivação circunstancial: a carreira, a crise, o momento e até as
vicissitudes afetivas. Muitas razões levam a que circunstancialmente a decisão
de ter filhos seja adiada, algumas vezes sine
die. Penso contudo que estas razões são o afloramento de algo mais profundo.
Esse afloramento reside num processo de ajustamento cultural
que Portugal está a experimentar e que conjuga uma série de fundamentos que
conduzem ao estado atual das coisas. Para já a boa notícia é, como em tudo na
vida, isto é temporário, a taxa de natalidade vai um dia começar a crescer.
Mas vejamos melhor.
Portugal passou de um País rural e com pressão social para
cumprimento de determinados comportamentos sociais, para um País
pretensiosamente urbano e sofisticado, mantendo os tiques enraizados ao longo
de muitos anos. Muito expressivo e curioso é vermos quão diferentes são os anos
80 dos anos 90 em Portugal, sendo esta década um período de afirmação e
independência face aos anos 80.
O carácter “pretensiosamente urbano e sofisticado” traduz-se
entre outras coisas na afirmação de que determinados comportamentos são
obsoletos, tradicionais ou antiquados e portanto na sua negação (o polo ou
extremo oposto). E aqui entra o ter filhos … Se quem tem filhos tem menos
disponibilidade para sair à noite, para jantar todos os dias fora, para
trabalhar 20 horas por dia 7 dias por semana, e por aí fora, está out. As novas vítimas de exclusão são os
pais e para não se ser vítima de exclusão … não se tem filhos.
Por outro lado, há uma agenda política que tem apelado a
comportamentos pouco baby friendly.
Atenção não considero que o problema seja político, é sim sociológico, mas a
agenda política tem influência. Se olharmos para os últimos 20 anos a
natalidade esteve sempre fora das agendas políticas.
Os temas fraturantes, tendo à cabeça os temas do aborto e
dos casais homossexuais, concorde-se ou discorde-se deles (não é aí que aqui
estou a ir), têm/tiveram o efeito de retirar o tema da natalidade da agenda
política. Enquanto se está entretido com estes temas fraturantes não nos
preocupamos com a natalidade.
Por outro lado, a questão da natalidade tem estado fora das políticas sociais. Veja-se, por exemplo, ao nível fiscal, em IRS, um casal paga mais
IRS do que dois solteiros e uma família com filhos é prejudicada relativamente
aos solteiros. Na verdade há um fator discriminatório e esse prejudica as
famílias com filhos. Se vou pagar mais impostos, …
Chegados aqui (e já vai longo o post) tenho a dizer que o
importante é just do it. Se pensarmos
muito não saímos do lugar e não temos filhos. Ter filhos é muito mais do que qualquer razão.
Deixemos, pois, de nos enredar em explicações para autojustificar não ter filhos, o que é preciso é, como diz
o Rui, fazê-los.